Por Dra. Paula Coutinho
A doença de Machado-Joseph (DMJ) é uma ataxia hereditária dominante que conduz a uma incapacidade motora grave e a uma morte precoce. Espalhada um pouco por todo o mundo, tem uma alta prevalência nos Açores, pare ondeterá sido levada pelos colonos que povoaram primitivamente o arquipélago e de onde foi ulteriormente "exportada" para os Estados Unidos da América e o Canadá.
Descrição Clínica Modo de início: A doença inicia-se normalmente por perturbações do equilíbrio, descritas de modo variado: dificuldade de andar em caminhos estreitos ou com fraca luminosidade, instabilidade ao dar voltas rápidas, sensação de insegurançaao descer escadas. Muitos doentes a comparam a um estado de ligeira embriaguez. A diplopia é um sintoma de início mais raro.Idade de início: E sempre difícil estabelecer com precisão a idade de início em doenças crónicas lentamente progressivas.
Calcula-se no entanto uma idade média de início de 40 anos, com extremos que vão dos 5 aos 70 anos. Nos casos de início precoce a doença tem uma forma mais grave, rapidamente incapacitante, nos casos tardios formas mais benignas que por vezes só é possível diagnosticar sabendo que o indivíduo pertence a famílias afectadas (embora possa eventualmente ter já transmitido a doença).
Manifestações neurológicas: A DMJ é caracterizada por um quadro clínico complexo, em que se associam, em proporções variáveis (conforme a idade de início), sintomas e sinais dependentes do envolvimento de vários sistemas:
Ataxia cerebelosa: Está presente em todos os doentes. À ataxia de marcha junta-se mais tarde incoordenação dos movimentos dos membros superiores e disartria. À medida que a ataxia progride as quedas tornam-se frequentes,depois a marcha só é possível com apoio e finalmente os doentes ficam limitados a cadeira de rodas. Em fases avançadas, a ataxia é tão grande que os doentes precisam de ajuda em todas as actividades da vida diária.
Manifestações oculares: A segunda manifestação clínica mais frequente (valiosa em termos de diagnóstico diferencial) é a oftalmoparésia externa progressiva. Acompanha-se quase sempre de diplopia e caracteriza-se por uma limitação precoce do olhar vertical para cima, seguida de limitação do olhar lateral. Os movimentos oculares não são harmoniosos, realizam-se com esforço e existe frequentemente nistagmo. Um outro sinal muito característico da DMJ, embora presente em apenas um terço dos casos, são os olhos "saltados": não se trata de uma verdadeira exoftalmia mas de um aumento da fenda por retracção palpebral.
Sindrome piramidal: O síndrome piramidal é um dos elementos dominantes do quadro clínico da DMJ:caracteriza-se por espasticidade dos membros inferiores, com reflexos osteotendinosos vivos; encontra-se frequentemente sinal de Babinski.
Sindrome periférico: Aparece sobretudo nos doentes mais velhos. A sua expressão clínica é variável, indo de uma simples abolição dos reflexos aquilianos até atrofia e fraqueza muscular distal, com arreflexia osteotendinosageneralizada. Encontram-se com frequência fasciculações, particularmente dos músculos das pernas e coxas.
Sindromes extrapiramidais: Não sendo dos mais comuns, são no entanto, uma das manifestações mais características da DMJ. Têm uma expressão muito variável em intensidade e tipo:
Quadro distónico: Em alguns doentes surge uma postura anormal dos últimos dedos das mãos, habitualmente em extensão, claramente agravada pelo movimento. Em fases avançadas são frequentes distorções e crispações da face, á volta da boca e do mento, envolvendo os movimentos da língua.
Quadro parkinsónico: Alguns doentes têm uma moderada bradicinésia, manifestada por amimia, com pobreza dos movimentos espontâneos da face, diminuição do pestanejo e lentificação de todos os movimentos voluntários. Apesar de todo o atingimento motor, é característica da DMJ uma perfeita integridade mental, mesmo quando os doentes já não conseguem comunicar.
Incapacidade: Na DMJ, as dificuldades motoras e de articulação verbal estão na base da dependência total que os doentes atingem. Pelos 10 anos de evolução, cerca de 50% dos doentes necessitam de algum tipo de apoio na marcha. Quanto á incapacidade de comunicação, aos 10 anos de evolução 25% dos doentes têm uma disartria grave (tornando impossível a comunicação com pessoas pouco habituadas).Sobrevida e morte: A sobrevida mediana é de cerca de 20 anos. A morte ocorre devido ás complicações habituais das fases terminais de doenças crónicas com alectuamento prolongado, ou devido a acidentes agudos de asfixia por aspiração.